-Em consonância com as significativas potencialidades históricas- patrimoniais da zona ribeirinha oriental de Lisboa, o Palácio Pátria (GLUP), tem o privilégio de integrar um nobre e importante edifício da freguesia.
-Com efeito, o local de implantação, na freguesia do Beato, do edificado que designamos por Palácio Pátria, integrou inicialmente uma zona térrea, de serviço, do magnífico solar do duque de Lafões, tendo posteriormente sido objecto de diversas transformações, nomeadamente para adaptação à instalação do Cinema Pátria e anos depois, para a actividade de uma congregação religiosa.
-Comecemos por uma breve alusão ao território circundante:
–A Freguesia do Beato
Um rápido olhar pelo espaço circundante, poderá resultar numa impressão de degradação e abandono arquitetónico / urbanístico, todavia e, não obstante, uma observação mais atenta, dará conta, simultaneamente, da existência de um património relevante, de grande potencial, a solicitar intervenção urgente, bem como, a implementação de um projecto de valorização e integração nos circuitos dinâmicos do turismo cultural urbano. Naturalmente que o plano de reabilitação da Zona Ribeirinha Oriental, tanto quanto se sabe, incluirá tais preocupações, não esquecendo o património relevante das antigas vilas operárias.
Numa perspectiva mais redutora e sem se pretender esgotar os exemplos, existem na freguesia e nas zonas próximas, vários edifícios históricos e arquitetónicos importantes, nomeadamente, o Palácio do Duque de Lafões, Palácio dos Marqueses de Olhão, Convento do Beato António, Convento de São Francisco de Xabregas, Convento e Igreja dos Grilos, Manutenção militar, Instalações da empresa Abel Pereira da Fonseca, Convento de Santa Maria de Jesus (antigo Paço Real de Enxobregas, actualmente IEFP/Teatro Ibérico). Ainda nas proximidades, será de referir, a Igreja e convento da Madre Deus, e um pouco mais longe, o convento de Santos o Novo, entre outros.
A freguesia do Beato, inserida na zona oriental de Lisboa (anteriormente denominada São Bartolomeu do Beato), criada em 1756 por desanexação de Santa Maria dos Olivais, obteve esta designação em resultado de ter decorrido no local. parte importante da vida de Frei António da Conceição (frade professo no Convento de Santo António de Xabregas).
As suas origens não estão claramente documentadas conhecendo-se, no entanto que em 1569 foi estabelecida a Paróquia (antiga designação para freguesia antes de 1910) de Santa Engrácia, como resultado da separação da de Santo Estevão. Por sua vez, Santa Engrácia, na segunda metade do seculo XVIII, irá integrar a nova paróquia de São Bartolomeu. Já mais próximo dos nossos dias, a sua estrutura espacial, resultou do processo de expansão para oriente da cidade de Lisboa desde o seculo XVIII, onde se fixaram diversas quintas e palácios senhoriais, bem como diversos conventos pontuando aquele território decorrente de vários factores nomeadamente, da insalubridade que se verificava na cidade. A industrialização e a expansão burguesa proporcionada pelo Liberalismo, foram elementos decisivos para o desenvolvimento da cidade. A extinção das Ordens Religiosas em 1834 e a consequente venda em hasta pública dos edifícios e terrenos (decretada pelo Governo Liberal) influenciou o estabelecimento industrial na zona Oriental de Lisboa. O território da freguesia proporcionando boas condições de escoamento de produtos potencializou a implantação da actividade comercial e industrial.
As primeiras unidades industriais importantes estabeleceram-se em estabelecimentos religiosos ou em palácios e, ao lado das fábricas instaladas, começaram a ser edificadas habitações para as famílias operárias, dando origem ás vilas operarias. Em 1867 e 1877 foram edificadas as primeiras vilas operárias e em 1888, construíram-se outras duas de maiores dimensões: a vila Flamiano para mestres e contra-mestres e a vila Dias exclusivamente para operários.
Contudo, apesar da rápida mutação, o local continuou a ser aprazível consubstanciando as preferências de muitas famílias Lisboetas, que ao Domingo, o frequentavam.
O processo de industrialização atraiu pessoas em busca de melhores condições de vida, buscando emprego nas empresas instaladas à beira-rio, tendo como consequência uma enorme transformação nos hábitos e costumes da população ribeirinha oriental. Entre as primeiras unidades industriais contam-se a Companhia de Fiação de Tecidos Lisbonense (que ocupará o Convento de São Francisco de Xabregas, a Fábrica de Fiação de Xabregas e a Fábrica de Fiação de Tecidos Oriental. Nos finais do seculo XIX trabalhavam nas fabricas de Xabregas entre 800 a 1000 operários, tendo surgido na época um forte movimento associativo, o qual suscitando o receio das autoridades perante eventuais movimentos reivindicativos, determinou a instalação da esquadra da polícia. na Vila Dias. Em 1896, a urgência em garantir alguns apoios e satisfação de necessidades básicas a famílias operárias em dificuldades, determinou a instalação das primeiras Cozinhas Económicas-
Na rua de Xabregas e na rua do Grilo, também gradualmente se foram instalando, diversos outros estabelecimentos, como oficinas, armazéns de retém e droguistas e até aos princípios do século vinte muitas outras industrias. foram aparecendo.
A implementação do caminho de ferro contribuirá igualmente para alteração significativa da paisagem com a construção de barreiras e diversas infraestruturas, como a ponte de ferro de Xabregas (1854) de autoria do eng. Valentine. O próprio traçado da via férrea contrariará a lógica da estrutura espacial das quintas e propriedades agrícolas.
Palácio Pátria /GLUP, (antigo Cinema Pátria)
O Palácio Pátria, templo principal da GLUP, ocupa o antigo espaço térreo de serviço do palácio ducal (sob os seus jardins) e que foi posteriormente utilizado, para estabelecimento do único cinema existente na freguesia – o Cinema Pátria. Este estabelecimento, que no acto da fundação, se anunciava algo pomposamente como “o mais distinto e com serviço selecionado”, foi fundado, em 1917, por um antigo funcionário da Companhia Cinematográfica de Portugal, José Perdigão.
Em 1928, José Manuel Ginga adquiriu o cinema, vendendo-o logo após, em 1931, á firma Mendonça e Sousa, a qual, no decorrer da década de trinta introduziu amplos melhoramentos, nomeadamente na sala de exibição, agora com capacidade de 447 espectadores. Um dos sócios daquela firma, Baldomero Charneca, que em 1950, assumiu a gerência, manteve o cinema em actividade durante longos anos, até que, em 1968, uma certa decadência e afastamento do público, determinou o seu encerramento durante algum tempo. Após a execução de obras de recuperação o cinema reabriu no início de setenta, (muito embora de forma intermitente) sendo que, nessa época o cinema comportava 250 lugares, com a particularidade da sua distribuição se processar por plateia e balcão. A partir da década de oitenta o cinema encerrou definitivamente, após o que, o espaço foi ocupado para fins da actividade religiosa.
Palácio dos Duques de Lafões
Na primeira metade do seculo XVII a Quinta do Grilo pertencia a D. António de Mascarenhas (1610-1654) e em 1630 foi incluída no dote de casamento de Dª Mariana de Castro com Henrique Sousa Tavares (1626-1706) 3º conde de Miranda e 1º marquês de Arronches. No ano de1715 a quinta do Grilo estava na posse de Luísa Casimira de Sousa Nassau e Ligne (1694-1729), 1ª duquesa de Lafões, e de Sousa, marquesa de Arronches, casada com o Infante D. Miguel de Bragança (1669-1724) filho natural do Rei D. Pedro II e meio irmão de D. João V, e que morreria afogado no Tejo.
Em 1756 começam as obras sobre os restos de um anterior palácio de veraneio
-O Palácio dos Duques de Lafões, cuja data de fundação atribui-se a finais do seculo XVIII (1777), foi edificado por D: João Carlos de Bragança de Sousa Ligne Tavares de Mascarenhas da Silva, 2º duque, o qual iniciou as obras em 1760, nos terrenos de uma bela quinta que aí possuía. Este fidalgo, segundo filho do Infante D. Miguel, foi figura notável de estadista, referenciado em diversas cortes europeias, marechal do exercito, fundador da Academia de Ciências de Lisboa (justamente num dos salões deste palácio, hamado de Sala da Academia). Apesar de ainda hoje ser considerado um imóvel de características residenciais de propriedade privada – entre os residentes conta-se o actual titular da casa de Lafões -, o edifício encontra-se classificado, como imóvel de interesse público, por portaria de 2012.
Apresenta planta em L, com volumes articulados e coberturas diferenciadas, incluído um corpo com 3 andares, foi alvo de intervenções diversas ao longo das épocas, sendo as principais, atribuídas aos arquitectos, Filipe Folque, Giovanni Barbieri (1717-1760), Eugénio dos Santos (1711-1760) e Cirillo Volkmar Machado (1748-1823),na pintura, nomeadamente na Sala da Academia. O Palácio, apresenta janelas de sacada e janelas de peito de emolduramento simples. Os corpos do edifício comunicam com portas e passagens encimadas por arcaria e os seus interiores e jardins apresentam interessante decoração com diversos motivos artísticos, de diferentes épocas (neoclássico, rococó) e modalidades, como sejam, a azulejaria do sec XVII, painéis do seculo XIX, estatuária, pintura, etc., com motivos alegóricos, mitológicos e representações heráldicas das casas de Lafões, Cadaval e Marialva.
Circundando o palácio, existiram quatro jardins, um dos quais, desenvolvendo-se no espaço actualmente ocupado pela rua do Beato, próximo da manutenção militar, desapareceu totalmente. Outro dos jardins, do conjunto de mais 3 que se desenvolviam em patamar, no interior da quinta, foi amputado pelo estabelecimento do caminho de ferro, o qual, de resto, cortou a quinta em duas partes. Estes jardins feitos de bucho, incluíam tanques com esculturas em pedra. O seu interior apresenta alguns salões artisticamente decorados, bem como a capela, sendo de destacar, a Sala dos Òculos (pavimentos em madeira e estuques policromos), Sala do Duque (tectos de pinturas ornamentais de festões, grinaldas e putti), Sala da Academia (estuques pintados policromados com motivos alegóricos do seculo XVIII), Sala Chinesa (pinturas neoclássicas) Sala de Vénus e Picadeiro (azulejos policromados rococó e neoclássicos) e Capela ( talha dourada, representação da coroa ducal, retábulo em talha policromada e marmoreada, do seculo XVIII).
A propriedade passando para a posse de sucessivas, foi herdada em 1878, por D. Caetano Segismundo de Bragança, o qual vendeu, para ampliação da Manutenção Militar, uma grande parte dos terrenos, a poente, fronteiros ao palácio, bem como aqueles, situados a norte, para fins urbanísticos. Estas transacções marcaram o desaparecimento da quinta, bem como a drástica redução dos magníficos jardins. Mas não foi apenas o património edificado e paisagístico que foi afectado com o rodar das vicissitudes do tempo, porquanto existem notícias sobre a desafetação de importante acervo artístico que se foi alienando. No Diário de Lisboa de 23 de Fevereiro de 1866, vem anunciado o leilão de cerca de 225 quadros a óleo das escolas italiana, espanhola e flamenga, alguns dos quais assinados por Van Dick, Rubens,Tintoretto, Mignard, Carraci, entre outros
No Início do século XIX, antes da construção da rua do Grilo e dada a proximidade do rio, existia um cais que se denominava dos “duques” e de que não restam quaisquer vestígios. Era normal, nessa época, os detentores de palácios e quintas próximos do Tejo deslocarem-se à cidade de Lisboa, por via fluvial.
Em 1946, o edifício era habitado pelo sétimo duque D. Lopo Caetano casado com Maria José da Graça Paço Viana Barreto, mantendo-se como residência, ainda nos dias de hoje.
T.’.A.’.F.’.
Março de 6017, a Oriente de Lisboa, G.’.P.’. da G.’.L.’.U.’.P.’.Fernando Casqueira